quinta-feira, fevereiro 28, 2013

Ballerina




Sempre achei fascinante todo o tipo de arte. Acho incrível o modo como as pessoas conseguem se expressar, usando apenas a própria voz, ou o corpo, por exemplo.

Uma das várias artes, no entanto, sempre me chamou a atenção: a dança. Não qualquer tipo de dança, mas o balé em especial. Encanta-me o jeito com que as dançarinas e dançarinos conseguem se mover com tanta delicadeza e precisão. A música suave é hipnotizante, e é inegável a aura de paz e conforto que a dança proporciona, embora eu nunca tenha praticado.

Não sei ao certo de onde surgiu tamanha paixão por algo que nem ao menos pratico, mas desconfio que isso se deve a um simples fato: eu me identifico. Certamente não é com a graça e o equilíbrio das dançarinas, mas porque, de certo modo, sei como elas se sentem.

Cada um dos espetáculos, por mais paz que transmitam, sempre escondem um pouco de tristeza. Afinal, por maior que seja a beleza, tudo tem seu lado triste. Talvez, no fim, seja isso o que tanto me atrai no balé. E eu me identifico com esse fato.

As bailarinas, por maiores que fossem as dificuldades que tivessem que enfrentar, nunca desistem dos seus sonhos, mesmo após cada um dos tombos que levam para chegar aonde querem. Elas sempre se levantam e continuam a dançar, sempre permanecem ali, fortes e decididas a atingir seus objetivos.
Mesmo que eu não tenha a delicadeza de uma dessas dançarinas, tenho esse ponto em comum. Admito que nem sempre é por escolha própria, mas me mantenho firme, e sempre será assim. Não importa qual o tamanho do problema, de uma forma ou de outra, sempre serei forçada a continuar. Não importa quantos tombos eu leve, serei forçada a me levantar e dançar, como uma boa bailarina.

sexta-feira, fevereiro 22, 2013

Regresso


A contagem tem começo
Estou decidida a fugir
Dois passos
E mais um tropeço

Sete.
Tão boba, tão criança
Olho em seus olhos e digo,
com a voz fraca: "repete"

Seis.
Até te contaria o que penso
Mas tenho medo
De soar descortês

Cinco.
Não sei o que fazer.
Devo mesmo desistir
Ou lutar com afinco?

Quatro.
Lutei enquanto pude
Mas esse é o fim
Estou cansada desse teatro

Três
Tento me despedir
Mas ainda me lembro
De tudo que você fez

Dois
Respiro fundo
Finalmente crio coragem
Bem, até depois.

Um.
Depois de tanto tempo,
você me fez entender:
Não vou a lugar algum.

domingo, fevereiro 17, 2013

Carnis valles


O Carnaval a fazia feliz. Poderia ser quem quisesse, desde uma princesa de contos de fadas até condenada de um tribunal sem juiz. Quem diria, mesmo eu estou rimando. Talvez por influência das marchinhas que a faziam sorrir?

Há muito eu já havia desistido de pensar de outra forma, de modo que era muito mais fácil ver minha mais nova aptidão para rimas como influência dela do que como o destino me mostrando que somos perfeitos um para o outro, ou qualquer baboseira romântica do tipo. Eu jamais aceitaria qualquer pessoa insinuando isso, o que não quer dizer que eu mesmo já não tenha considerado essa hipótese. Não sei por quê. Timidez infundada, provavelmente.

Por entre milhares de pessoas andei, apenas protegendo-a a distância. Sem jamais me aproximar. Sem jamais convencê-la de que não era um dos muitos demônios que queriam corrompê-la.  E por entre as milhares de pessoas pelas quais passei, devo dizer que nenhuma poderia ter escolhido melhor fantasia. Anjo. Tão simples. Tão perfeita. Minha anja. Apenas minha. Mesmo que não soubesse.

“Ela saberá antes do fim da semana”, eu me prometi. Ah, como me enganei. Deveria saber que as coisas jamais saem como esperamos. Planejar é tolice, as melhores coisas vêm por acaso, bem como as piores. Carnaval. Carnis valles. Os prazeres da carne. Ah, como eu gostaria de evitar tudo isso, como eu gostaria de ter sabido antes o que iria acontecer, mesmo que jamais tenha confiado em grandes multidões.

No primeiro dia de comemoração, fiz-me um guerreiro romano. Lutaria por ela se fosse preciso. No segundo dia, virei Clark Kent. No terceiro dia, o desespero tomou o lugar do meu bom humor, quando não a achei. Quisera eu ter sido mais vigilante, mas era tarde demais e eu sabia disso. Enquanto as pessoas voltavam para casa, vencidos pelo cansaço, mais eu me decidia a permanecer e procurar por ela. Todos os demônios que perseguiam meu anjo enfim conseguiram me driblar, ou era apenas paranoia minha? De repente todos me pareciam suspeitos de um crime ainda não cometido.

Os sorrisos enviesados, de máscaras ou não, acompanhados de um olhar travesso pareciam me seguir, onde quer que eu fosse e para onde quer que eu olhasse. Há tempos eu acharia divertido. No momento, eu achava perturbador. Por que estavam fazendo isso? Por que a escondiam de mim? Uma pequena parte de mim dizia que eu estava exagerando, que não precisava agir como se fosse uma conspiração, afinal. Mas ainda assim, eu sabia que precisava achá-la.

No primeiro dia, eu a defendi de todos os modos possíveis, como um bom soldado faria, mesmo que ela não soubesse. No segundo dia, permiti-me observá-la mais como homem do que como herói, e cheguei a conclusão de que nunca nenhum anjo verdadeiro seria tão belo quanto ela. No terceiro dia, por um pequeno descuido, a perdi de vista. E por mais que a procurasse entre todas aquelas pessoas, só a encontrei no fim da noite. Com sua roupa agora suja de sangue e penas de asas que não puderam ajudá-la a fugir pelos céus quando mais precisou, soube que tudo havia acabado. Minha pequena anja agora estava no céu.  E na quarta feira, cinzas eu me tornei.